O tempo comprovou que prefeitos, governadores e o presidente da República, uma vez eleitos, tomam posse já com o pensamento voltado para a conquista de um novo mandato, dali a quatro anos. O governo que deveria ser de coalização, em torno da aprovação e execução de projetos em benefício da população, transforma-se, invariavelmente, em governo de cooptação, com a distribuição de cargos, troca de favores e o uso despudorado da máquina pública para fins meramente eleitorais, incluindo nomeações políticas e empreguismo, desequilibrando o pleito ao conferir vantagem àquele que ocupa cargo executivo. Propicia “alianças” eleitorais precoces e múltiplas e desvirtua – ou anula - o papel fiscalizatório do Legislativo.
O próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que em 1997 se empenhou para a aprovação da proposta de emenda constitucional que acabaria lhe beneficiando na medida que possibilitou sua reeleição, já reconheceu em artigo que a iniciativa foi um erro histórico. “Imaginar que os presidentes não farão o impossível para ganhar a reeleição é ingenuidade”, afirmou FHC, em mea-culpa.
O estrago já está feito, mas é possível a correção de rumo para não se perpetuar o equívoco e seus prejuízos. Se quatro anos é pouco para um cargo executivo e a reeleição é desastrosa, a opção pelo mandato de cinco anos para presidente da República, governadores e prefeitos, sem possibilidade de reeleição, parece a mais adequada. Tal alternativa não somente permitiria a reclamada conclusão de projetos administrativos de uma gestão, como também consagraria o princípio democrático da alternância no poder, estimulando o surgimento de novas lideranças, bem ao contrário do que assistimos hoje.
Por outro lado, é preciso rever também a questão do Fundo Eleitoral. É absolutamente inconcebível que um país com tantas mazelas sociais e com 20% da população vivendo abaixo da linha da pobreza, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), destine verdadeira fortuna para o financiamento de campanhas eleitorais. Em 2020, foram nada menos do que R$ 2,03 bilhões, recursos que teriam destino mais nobre caso fossem investidos para mitigar as principais carências nacionais como saúde, educação, habitação, segurança e saneamento básico.
Se cada cidadão brasileiro tivesse consciência dessa realidade, certamente questionaria porque os impostos que pagamos têm de financiar a custosa campanha de alguém para que essa pessoa alcance o topo da pirâmide, enquanto a maioria continua sofrendo as consequências das enormes desigualdades sociais que o Brasil não é capaz de eliminar porque não as enfrenta com seriedade.
O modelo atual, perverso, tira dinheiro do pobre para eleger quem vai ganhar muito durante o mandato, período recheado de privilégios, retroalimentando um sistema injusto, que cristaliza as elites.
Reformas são necessárias e urgentes. Sem elas, os abismos sociais somente se acentuarão. Os brasileiros não merecem que seu futuro seja ainda pior que o presente.
**Samuel Hanan é engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário, e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002). É autor do livro “Brasil, um país à deriva”.
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