Após estampar importantes listas de melhores do ano com o
disco “Ansiedade na Cidade” (Natura Musical), como Rolling Stone, Noize e
Popload, a Catavento segue divulgando o álbume, enquanto se prepara para
estrear no palco do Lollapalooza, lança o clipe de “Se Não Vai”. Filmado em
uma padaria ainda "humanizada" no bairro de Pinheiros, o registro do
trabalho, do corpo engajado na atividade produtiva, constitui um tema
fundamental da história do audiovisual e faz uma relação direta com a música
que reflete sobre olhar pra si mesmo e escolher uma direção para seguir.
A locação escolhida foi a padaria CPL, na rua João Moura, no
bairro de Pinheiros, em São Paulo, região que vive um agressivo processo de
gentrificação desde 2010. O clipe começa apresentando a rotina e as expressões
dos trabalhadores, às vezes preocupadas, outras mais relaxadas, mas que parecem
sempre pensativas.
O estabelecimento,
fundado na década de 80, permanece como um dos últimos espaços de seu tipo no
bairro, sem catracas ou comandas plásticas, preservado o mínimo laço de
confiança e sociabilidade entre funcionários e clientes que novas tecnologias
de controle
sacrificam.
"Parece que tanto os clientes, quanto os trabalhadores estão,
individualmente, botando suas respectivas vidas em xeque, ao mesmo tempo em que
simplesmente seguem a rotina: 'será que vou? Será que volto? Será que é isso?
Vou vazar. Vou ficar.'.
Todos são
particularmente autênticos, ao mesmo tempo que são quase iguais. São humanos,
na Terra, em São Paulo, no bairro de Pinheiros, convivendo em uma das poucas
áreas de sobrevivência da interação humana não mecanizada", reflete o guitarrista
e vocalista Leo Lucena, compositor da música.
Com direção da responsável pelo clipe de “Panca Úmida”,
Manoela Cezar e de Pedro França, o vídeo também explora a cadência
"aquática" da música, enfatizada pelo fato de que os vocais não
dominam os demais instrumentos. "Decidimos fazer o clipe em uma padaria,
filmando a rotina de trabalho dos funcionários, e culminando no momento de
lavagem do chão, no final do dia. A montagem progride dos cortes secos do
início às sobreposições úmidas do final. Esse movimento é acompanhado pelas
transformações na cor, que é natural no começo e hiper saturada e manipulada no
fim. O momento de transição entre o princípio mais clássico e o final delirante
é o longo plano da dança", diz Pedro.
A dança é encenada por Ones Cervelin, ator da cia teatral
Ueinzz e, segundo Leo Lucena, quando ele aparece, provoca um momento lúdico no
dia a dia daquele lugar: "Ele só quer dançar. É só isso que ele está
pensando". No entanto, aquelas pessoas estão ocupadas demais para notar.
Todos têm muito trabalho a fazer: o suco pra servir, um e-mail pra mandar e, no
fim do dia, o chão pra lavar. Nesse correr da rotina, o pensamento quer seguir
um caminho, que muitas vezes nos é apresentado por acaso.
Por isso, neste clipe a Catavento convida o espectador a
deixar o vai e vem das tarefas mais interessante, e a tentar observar poesia
onde, normalmente, não seria possível. Por exemplo, a forma como que a água com
sabão escorrega sem parar pelas lajotas, fazendo assim, um casamento perfeito
com a música. "Seria um sonho poder ver e viver tudo dessa forma dançante
e harmoniosa. Todos os dias. Mas você tem que querer muito se deixar levar.
Você tem que confiar no acaso", completa Leo.
Como referência audiovisual, a direção mergulhou em um dos
primeiros filmes produzidos na história do cinema, La Sortie de l'usine Lumière
à Lyon (1895), que registrou trabalhadores deixando a fábrica de tecido dos
irmãos Lumière. Além disso, segundo o diretor Pedro França, "o cinema
soviético monumentalizou o corpo do trabalhador, Chaplin satirizou sua
submissão à máquina, e Bresson consagrou formas de representação do gesto que
nos influenciaram na escolha dos enquadramentos e ritmos. Entendemos que o
clipe é uma peça autônoma, em que som e imagem convivem de forma não
hierarquizada, como de resto é característico de toda obra audiovisual".
O lançamento do clipe faz parte do projeto de “Ansiedade na
Cidade”. Ele foi selecionado pelo Natura Musical por meio do edital 2017 em
parceria com o Pró-Cultura (RS) e Secretaria de Estado da Cultura, Turismo,
Esporte e Lazer do Rio Grande do Sul. “Acreditamos na força do Natura Musical
para conectar pessoas, valorizar a criatividade brasileira e revelar a
diversidade de cada região do país”, diz Fernanda Paiva, gerente de Marketing
Institucional da Natura. “O programa já circulou por 20 Estados, apostando em
talentos locais. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o edital ofereceu recursos para 17 projetos da
música, como Dingo Bells, CCOMA, Yangos, Musa Híbrida e, agora, Catavento”,
complementa.
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