A obra se constitui no desenho de um padrão do movimento cíclico da vida, começando pela coragem de nascer, com a faixa Iniciação, percorrendo diversas nuances, até findar com a morte necessária para renascer, com a faixa Despedida. “Lunar é um convite a recordar a inteligência cíclica da vida. As canções estão diretamente ligadas a uma investigação pessoal e artística em torno dessa energia cíclica que move tudo o que é vivo, do vazio criativo ao brotar, crescer, dar e colher frutos, processar e morrer para renascer”, explica Laura. Também fazem parte do repertório as canções Lunar, Depois do Horizonte, Flecha – composição da artista com sua mãe Conceição Tavares –, Chão Novo, entre outras.
Além das composições e parcerias, Lunar traz quatro faixas com cantigas tradicionais. Uma delas, “Ajuda Eu, Tambor”, traz um arranjo que entrelaça três cantigas: uma brasileira, uma do Togo e uma da Costa do Marfim; cantadas por Laura junto a artistas convidados desses três países e também do Burkina Faso. “É uma faixa dedicada ao encontro, à diversidade que encontramos quando vamos abertos para o mundo”. Laura tem viajado regularmente ao Burkina Faso desde 2018, trabalhando em parceria com o contador de histórias François Moïse Bamba – que também canta no álbum – e participando do seu Festival Internacional dos Patrimônios Imateriais-FIPI. Nessas viagens, a música é sempre viés de encontro. O diálogo com a musicalidade da África do Oeste aparece em outras faixas, com participações também de instrumentistas locais.
Com instrumentação base de vozes, cordas e percussões, Lunar tem no time principal ao lado de Laura, que assina as vozes e algumas percussões, Rodrigo Samico – cordas –, Helder Vasconcelos – percussões e fole de oito baixos –, Johann Brehmer – percussões e concertina – e Rodrigo Félix – percussões. Nas participações especiais, além dos artistas africanos, estão também artistas brasileiros como Alessandra Leão e André Hosoi, do grupo Barbatuques. A produção musical é de Laura Tamiana e Helder Vasconcelos, com a coprodução de Rodrigo Samico e Johann Brehmer. Os arranjos do álbum foram feitos coletivamente por Laura, Helder, Johhan, Félix e Samico, que assina os arranjos das cordas, com a participação também dos convidados.
O disco marca a estreia da paulistana radicada em Recife Laura Tamiana como compositora e cantora-intérprete solo. Multiartista, com uma carreira que propõe diálogos entre as artes visuais, as artes da cena, a cultura popular, a música e a palavra, Laura vem compondo canções desde 2014. “Vinha há alguns anos acalentando esse desejo do disco, e com as interrupções das viagens, que normalmente ocupam bastante minha agenda, devido à pandemia, pensei: "é agora". Com os recursos da Lei Aldir Blanc, junto com um chapéu de contribuições, conseguimos viabilizar. Penso que não por acaso ele nasce nesse momento, que nos demanda reflexões tão profundas. Sinto que esse exercício de recordar nossa natureza cíclica é essencial aos nossos processos e às transformações pessoais e coletivas que se mostram urgentes em nosso tempo. É nesse aprendizado que tenho buscado minhas forças”.
Laura conta que criar e lançar um álbum no meio de uma pandemia mundial foi fortalecedor e ao mesmo tempo desafiador. “Sinto que é uma dádiva poder criar e produzir num momento tão duro e de tantas incertezas como este que estamos vivendo. Agradeço profunda e cotidianamente por essa possibilidade. Criar dá sentido ao meu viver. E poder nesse momento mergulhar nessas composições, dar corpo a essas músicas junto a músicos e parceiros incríveis, dar espaço à minha voz, ao que sou e ao que posso dizer agora é muito fortalecedor. Desejo muito que assim seja também quando as músicas chegarem aos ouvidos de quem ouvir”, projeta. Durante a pandemia, nasceu a música ‘Dilema da Flor’, com letra de Claudia Pucci Abrahão e música de Laura. É um retrato do momento inicial da pandemia, o confinamento, a suspensão, a resiliência, o medo, as dúvidas, a confiança em algo maior. Também durante a pandemia, a canção ‘De canto a canto’, que já existia, ganhou uma nova parte, em texto falado. A música trata do que é o canto para Laura, um viés do encontro, uma potência expressiva e ancestral. “Essa música é dedicada a Guitinho da Xambá, amigo muito querido, artista e articulador extraordinário que nos deixou nesse período. Ele, que soube tão bem através do seu canto – e não só – expressar, representar e divulgar a cultura da sua comunidade, deixando um legado fortíssimo”, afirma Laura.
Sobre as dificuldades de produzir um álbum nesse momento tão conturbado, Laura conta sobre os desafios encontrados. “Os prazos do projeto eram inicialmente bem apertados e rapidamente deu para perceber que os planejamentos não saiam como antes, que os tempos escapavam pelos dedos, que a situação de crise afeta a todos de diversas formas, desde adoecimentos nas famílias e na equipe, até processos mais subjetivos. Foi necessária uma resiliência e adaptação, para encontrar um fluxo de produção”. Uma característica interessante é que a equipe teve que fazer muita coisa à distância, pelas restrições, mas a adaptação deu certo. Primeiro porque todos os principais envolvidos na gravação têm estúdio em casa. As gravações foram feitas em três estúdios: as vozes na Terreiro, que é na casa de Laura Tamiana e Helder Vasconcelos; as percussões no Palhoça, de Johann Brehmer; e as cordas no Solto no Tempo Studios, de Rodrigo Samico. E segundo porque o disco conta com essas muitas participações escolhidas por relações artísticas e afetivas, espalhadas em outras cidades do Brasil e nos três países da África; participações essas que foram sendo gravadas em seus diferentes locais.
O álbum completo disponível no canal de youtube de Laura Tamiana (https://youtu.be/q-fTEzY7nCs) foi lançado junto ao encarte de Laís Domingues. Para conceber as obras que integram o encarte, Laís Domingues seguiu o caminho do movimento, muito presente na obra de Laura e no próprio álbum. Compôs imagens com fotografias de Laura – convidando-a a dançar as próprias faixas do disco e depois escolhendo uma imagem/movimento para cada faixa –, misturando-as a fotografias do acervo de Laura, de seus territórios afetivos. As imagens, reveladas com o processo artesanal da cianotipia, receberam depois intervenções em bordado. O encarte conta também com o trabalho de Flávia Tavares, no desenho gráfico e edição de imagens. Além das artes, o encarte traz as letras e fichas técnicas das músicas, além de um texto de apresentação e agradecimentos.
Laura Tamiana - Laura Tamiana (Recife/Brasil) é artista, além de produtora e facilitadora de processos terapêuticos. Cria e desenvolve projetos que envolvem a música, as artes visuais, a palavra, as artes do corpo e as culturas tradicionais, sempre com o propósito de promover o encontro entre pessoas e contextos, a partir de um viés afetivo e de questões em torno de identidade, pertencimento e memória. Tem especialização em Cooperação Artística Internacional pela Universidade Paris VIII, França.
Desde 2007 integra os grupos do Carnaval pernambucano Maracatu de Baque Solto Piaba de Ouro, como baiana puxadora de cordão, e Boi Marinho, compondo o núcleo principal do grupo, como puxadora de cordão, cantora e percussionista. Com o Boi Marinho, realizou diversas apresentações também em centro culturais, festivais e eventos, como o Circuito Sesc de Artes, do SESC SP, e o festival Europalia, na Bélgica.
Unindo pesquisa e criação, audiovisual e cultura popular, realiza desde 2009 o projeto Retrato: substantivo feminino, uma criação coletiva em foto e vídeo envolvendo mulheres ligadas a diferentes manifestações culturais tradicionais no Brasil e também na África, realizado em parceria com Tatiana Devos Gentile. Através de residências artísticas, as mulheres são convidadas a utilizarem as ferramentas audiovisuais para contarem suas histórias e de suas comunidades. O projeto tem um vasto percurso de exposições e intervenções; além da publicação de um livro. Laura Tamiana também é responsável pelos projetos audiovisuais Céu e Terra e História: conta.
Trabalha desde 2017 em parceria com o contador de histórias François Moïse Bamba, uma das maiores referências entre os contadores de histórias da África do Oeste, dividindo a cena com o artista em suas apresentações no Brasil, com uma tradução em forma artística e participações nos cantos. Juntos, criaram Ba-kô Burkina Brasil, uma ponte cultural e artística entre o Brasil e a África do Oeste, pela porta do Burkina Faso, com ações culturais e artísticas nos dois países. Em 2020, Laura juntamente ao artista pernambucano Helder Vasconcelos, representou o Brasil no Festival Internacional dos Patrimônios Imateriais, realizado por Bamba no Burkina Faso. E está selecionada para participar do evento RIAO – encontros da oralidade, no Benin, em novembro de 2021, com intervenções musicais e uma oficina em torno dos processos criativos.
Em parceria com Alba Cabral, cantora e multi-instrumentista residente em Londres, criou As Pareias, um duo de intervenções musicais que se apresentou no festival francês Fidé – Festival Internacional do Cinema Emergente; e participou do show de sua banda Pé de Jurema, em Londres. Participou do CD Sambador de Helder Vasconcelos, gravando vocais. Também junto a Helder Vasconcelos, participa com vozes e percussões de apresentações e bailes de forró em diversos locais desde 2007.
Em dezembro de 2020 iniciou a série audiovisual De canto a canto, com o vídeo “Na voz das Yabás”, em torno dos cantos das mulheres da Nação Xambá, contemplado no edital de emergência do SESC PE.
Serviço
Lançamento do álbum Lunar, de Laura Tamiana
Youtube: https://www.youtube.com/c/LauraTamiana
Inventivo: Lei Aldir Blanc, Pernambuco
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