Era necessária uma dose de paciência extra para entender que, apesar de danosa, havia boa intenção naqueles que a pronunciavam. Essa frase “inocente” é apenas a ponta visível de um enorme iceberg, fruto de um péssimo entendimento da realidade e de uma espiritualidade adoentada com positivismo tóxico. É como um grande castelo de areia, bonito, porém, uma imagem frágil do que seria um castelo real, feito normalmente de pedra e com sólidas fundações.
Falta, na grande maioria dos que se dizem religiosos, uma percepção realista que o próprio evangelho saudável de Cristo nos fornece como fundação. Jesus mesmo disse que quem ouve suas palavras e as põe em prática é como um homem que construiu sua casa fundada sobre rocha. Ainda assim, a sociedade insiste em erguer suas casas sobre a areia.
O evangelho de verdade é realista: revela como a existência é dura e cheia de desafios. Passar por uma situação realmente pesada de vida ou morte – como a que minha esposa enfrentou – é um divisor de águas na espiritualidade. O excesso de positividade se desfaz como um castelo de areia diante do impacto das ondas do mar. Aquela espiritualidade puramente mística se ofusca na dura realidade das sessões de quimioterapia e nas salas de espera em longas cirurgias.
Para aqueles que realmente querem se preparar para ser saudáveis espiritualmente, é preciso entender que os sofrimentos são passageiros, e mesmo que venham, devemos lutar com as ferramentas que temos a nossa disposição. Médicos e terapeutas cuidam do nosso corpo, pastores e padres zelam pela caminhada espiritual de maneira honrosa, mas também honesta.
*Carlos Franciscon é pastor, escritor, especialista de suporte técnico e bacharel em Teologia, autor do livro Na Alegria e Na Dor.
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