sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Risco sacado: Entenda o processo de contabilidade que afetou as Americanas



Uma das empresas gigantes do varejo do país, as Americanas anunciou ao mercado que havia constatado “inconsistências contábeis” na ordem de R$ 20 bilhões nos últimos anos, mas ainda não está claro qual o impacto disso no caixa da empresa. Isso é mais do que os cerca de R$ 15,7 bilhões que a firma valia em 30 de setembro de 2022, quando foi fechado o último balanço.

As ações das Americanas despencaram aproximadamente 80% no pregão e as negociações foram interrompidas, levando junto para o buraco ações de outras grandes varejistas, como Magalu e Via.

O motivo do contágio inicial foi a explicação que as inconsistências no balanço das Americanas ocorreram na contabilização do financiamento aos fornecedores, o chamado ‘risco sacado’. Uma operação para lá de tradicional, espalhada pelo varejo, mas também usada pela indústria.

De acordo com o especialista em finanças e sócio da AJS Capital, Aurimar Borges, no risco sacado uma empresa recebe os produtos de seu fornecedor ou a execução dos seus serviços antecipadamente ao pagamento. Dessa maneira, o valor e as formas de pagamento são acordadas entre as partes de forma prévia.

“Nessa operação, o fornecedor efetua a emissão de uma fatura com um prazo a ser financiado por um banco ou instituição financeira autorizada a oferecer essa modalidade, ou seja, o banco credor do risco sacado. Entretanto, o valor de venda não é considerado pelo fornecedor em sua contabilidade quando essa operação é feita. Da mesma forma, a empresa que está pagando de forma antecipada também não reconhece o valor de saída em seu passivo oneroso. Ao invés de considerar como “passivo oneroso”, a empresa coloca o valor do montante pago como passivo de “fornecedores”, explica Aurimar.

As operações de risco sacado da Americanas não figuravam no balanço trimestral da companhia. Dessa forma, elas não eram mostradas ao mercado como “dívidas”, mas como uma conta de fornecedores. Já os juros que seriam pagos ao banco eram contabilizados como redução na conta de fornecedores e não como uma despesa financeira da empresa varejista. Foi dessa maneira que a empresa amontoou uma dívida bilionária com seus fornecedores que não era de conhecimento do mercado financeiro e dos investidores.

Para o especialista em finanças, para que essa solução seja atrativa ao mercado, precisa ser simples e rápida para todos envolvidos. Então quatro personagens são importantes.

“O sacado (comprador), o cedente (fornecedor), a fonte financiadora e o sistema são pontos fundamentais para que o risco sacado funcione. Quando o fornecedor faz uma venda a prazo de 30 dias e emite uma nota fiscal a pagar pelo comprador, a partir do momento que essa NF estiver performada, a mercadoria entregue ou o serviço prestado, podemos dizer que esse direito a receber do fornecedor está elegível para ser antecipado. O sistema contratado vai poder identificar todos esses compromissos a receber do fornecedor ficando disponível para o fornecedor simular e contratar a operação quando for mais vantajoso”, aponta Aurimar Borges.

Os títulos que não forem antecipados até a data limite, sairão do sistema de antecipação e voltarão para o agendamento de pagamento do título no prazo determinado.

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