O que aconteceria se mais da metade de uma população fosse imunizada contra a covid-19? A pouco mais de 300 km de São Paulo, a cidade de Serrana foi escolhida para responder a essa pergunta. A vacinação em massa começou em 17 de fevereiro e foi concluída no dia 11 de abril, com a aplicação das duas doses da Coronavac. Nos dias 8 e 9 de abril, o Estadão esteve lá para ouvir moradores. Entre as expectativas estavam o desafogo do sistema de saúde, a retomada da economia, a volta da vida social e dos estudos - além da esperança em dormir mais tranquilo.
Ao todo, são 27.160 mil moradores imunizados - o equivalente
a 95,7% da população-alvo na cidade, de 45.644 mil habitantes. "Essa
adesão mostra a vontade de viver da nossa população", diz Leila Gusmão,
vice-prefeita e secretária de Saúde.
O Projeto S, uma referência ao vírus Sars-CoV-2 e à cidade,
começou em meio a uma crise. "Em 2020 (após um surto de covid que atingiu
idosos e funcionários de um asilo), fizemos um inquérito epidemiológico para
avaliar a transmissão do coronavírus, além do Censo da Saúde para
mapeá-la", diz ela. Foi quando começou a parceria com o Instituto
Butantan.
Com as informações, concluiu-se que 8,75% da população tinha
tido contato com o vírus e 5% estava com o vírus ativo, infectando outras
pessoas. "Essa foi uma das taxas mais altas entre todas as cidades do
Estado que fizeram o inquérito", diz Marcos de Carvalho Borges,
investigador principal do Projeto S.
Ao se pensar o projeto, outros atrativos locais foram o fato
de a cidade ser pequena, ter hospital estadual e funcionar como dormitório para
aproximadamente 20 mil pessoas que trabalham em Ribeirão Preto. O grande fluxo
intermunicipal foi visto como fator para medir a efetividade da vacinação.
Entre os já vacinados, há uma mescla de gratidão e alívio.
"A sensação é muito boa, até porque nossa cidade foi privilegiada. A
pandemia afetou um pouco os meus estudos e trabalho. Não só os meus, mas os de
outras pessoas da minha família também", afirma o estudante Gabriel
Talavera, de 21 anos.
Sem falar nos que se sentem satisfeitos só pelo fato de
colaborarem com um possível avanço científico. Nos meses de outubro e novembro,
carros contratados pela prefeitura anunciaram o Projeto S de casa em casa e
identificaram os moradores que topariam aderir ao estudo como voluntários, caso
houvesse a fabricação de vacina.
"Decidi participar voluntariamente desse projeto do
Butantan porque os pesquisadores ainda estão estudando o coronavírus",
ressalta o advogado Diego Braga, de 28 anos. "Fui vacinado contra a
covid-19 na escola onde estudei. Tem coisas que ainda não sabemos muito bem,
como os efeitos e as sequelas. Foi por livre e espontânea vontade, porque eu
acredito na ciência, nos fatos e no SUS (Sistema Único de Saúde )."
Dia a dia
A rotina, porém, ainda está longe do normal. "Antes do
coronavírus, estávamos sempre aqui na praça central, todo dia. Por causa da
pandemia, estamos ficando um pouco mais em casa. Às vezes, passo dois ou três
dias sem vir. Temos medo do vírus, porque vimos o que ele andou aprontando por
aí", afirma Aparecido Donizzete Pedro, de 62 anos, um daqueles definidos
no Estado para o grupo prioritário de vacinação.
Há ainda uma rotina igual a de outras cidades sem
imunização: o respeito aos protocolos e às máscaras. "Quando todos
estiverem imunizados, quero tirar essa máscara. Mas acho que ainda vai demorar
um tempo, porque não adianta eu estar imunizado e acabar transmitindo para
outra pessoa que ainda não se vacinou contra a covid-19", diz o mecânico
pneumático Guilherme Costa, de 33 anos, cujo serviço caiu bastante na pandemia.
"O que custa participarmos? Conseguimos tomar a vacina de graça. Acho que
não vai fazer mal, só nos ajudar."
Com a paralisação da economia, muitos precisaram de ajuda
para se manter. "Eu trabalho em um carrinho de pipoca no Novo Shopping, em
Ribeirão Preto. Está fechado, sem ninguém trabalhando. Estou parada, mas os
patrões estão pagando uma parte para nós", relatou a atendente Arlete
Neres Nogueira, de 36 anos.
E os patrões também sentiram a situação. "Com exceção
de supermercados, farmácias e postos de gasolina, o comércio todo sofreu muito.
Fizemos de tudo para segurar funcionários", diz o comerciante José Antônio
Issa, de 59 anos. "Para ajudar nos custos, participamos do programa do
governo de suspensão de contratos. Comprávamos o que era necessário, mas foi
difícil."
Resultados
Concluída a vacinação, os pesquisadores avaliam agora seu
impacto na redução de casos graves, na mortalidade, nas internações e na
transmissão do vírus em Serrana. Segundo Marcos de Carvalho Borges,
investigador principal do estudo, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo (USP), resultados preliminares começarão a ser
divulgados no meio deste mês pelo Instituto Butantan.
Mas eles já começam a ser notados pelos moradores. "Na
Unidade de Pronto Atendimento (UPA), atendemos todos os casos de síndrome
gripal com diagnóstico ou suspeita de covid-19. A única mudança é na procura:
já podemos observar queda na quantidade de pessoas que procuram a UPA. Os casos
graves também caíram consideravelmente. Não tivemos nenhum paciente intubado
nas últimas semanas", diz o médico Angel Dario Ariza. As informações são
do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte:Estadão Conteúdo
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