O curso mineiro do rio São Francisco ambienta o cenário ficcional para reviver, nos palcos, uma jornada de resistência negra, popular e artística protagonizada por dois personagens icônicos da cultura geraizeira - termo usado para descrever quem vive nessa região do cerrado brasileiro. O musical “Entre Dois Santos” transplanta para o teatro a valorosa combinação histórica da trajetória de luta feminina de Maria do Batuque, personificação da força e da representatividade das matrizes afrobrasileiras no norte de Minas Gerais, e de Antônio Dó, liderança guerreira paramilitar essencial à sobrevivência dos quilombos instalados na área.
O musical tem apresentação única e pela primeira vez no Recife neste sábado, às 19h, no Teatro Barreto Júnior (no Pina), com acesso gratuito e retirada de ingresso uma hora antes na bilheteria da casa. O espetáculo usa elementos da fantasia para ativar a imaginação e envolver crianças e adultos na jornada da batuqueira reconhecida como patrimônio da cultura popular pelo governo brasileiro em 2008 - ela é filha e herdeira artística de Dona Ernestina Francisca Cardoso, citada em poema do autor Guimarães Rosa -, e do homem considerado um “Lampião” do norte mineiro.
A peça apresentada pela companhia mineira de teatro A Trupe realça o poder das tradições populares encampadas por Maria do Batuque, hoje com 94 anos, e reconstitui tanto personagens como passagens marcantes na defesa dos quilombos mineiros, como homenageia à altura Antônio Dó, liderança conhecido pela defensa incansável da sobrevivência dos povos negros habitantes da região. A concepção e direção é assinada pelo teatrólogo e produtor cultural Ricardo Simões, com texto escrito por Héryton Machado e produção local de Malu Vieira e Marina Duarte, do Casulo - Artes Circenses.
A cenografia carrega em elementos visuais impactantes e acolhe projeções mapeadas ao espetáculo para promover uma interação estética convidativa e rica no uso das multilinguagens sobre o palco. Há elementos similares à poética e à lírica presentes em obras literárias e visuais características do interior pernambucano, igualmente entrecortado pelo curso do Rio São Francisco.
Os atores interpretam tanto personagens retratados na narrativa quanto elementos naturais da paisagem local ou figuras associadas ao folclore mineiro. A protagonista é recriada por Vanessa Gaia, também no papel de “Mulher do Sapo Cururu”. Za Di Calú dá vida a “Jerômo”. Emerson Aquino é “Manezin”. Héryton é “O Caboclo do Rio”, “Manin” e “Tone Dó”. Ricardo Simões, “João Congo” e o “Rio”. O espetáculo é atravessado pela participação de brincantes do Boi Bumbá de São Romão (MG), conduzidos pelo agitador cultural Amilton Pereira da Silva, um dos herdeiros da tradição liderada por Dona Ernestina e pela filha Dona Maria do Batuque.
O musical sobre a tenacidade da cultura popular ao longo dos anos e a importância contra o apagamento característico das representações negras não é a primeira produção sobre a vida e a obra de Maria do Batuque. A trajetória dela já ganhou visibilidade com o trabalho documental do CD-Livro “Batuquim vai abaixo? Ele não vai, não”, em 2007, disponível no YouTube. O espetáculo “Entre Dois Santos” faz parte do projeto: Diversão em Cena, patrocinado pela Lei Federal de Incentivo à Cultura – Lei Rouanet.
+ História
A Cia A Trupe foi fundada em 1999 e atua com foco na difusão da cultura do norte de Minas Gerais, com atividades cênicas, de formação, de mobilização identitária e com colaborações artísticas para promover conscientização sobre a relevância da cultura popular. Já encenou A Morte do Amadeu e o espetáculo O Caixeiro e a Flor.
Serviço:
Musical “Entre Dois Santos”, da Cia A Trupe
Quando: no sábado, às 19h
Onde: Teatro Barreto Júnior (Rua Estudante Jeremias Bastos, s/n, Pina, Recife)
Quanto: acesso gratuito (com retirada de ingressos na bilheteria uma hora antes)
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