Embora o governo Lula tenha um viés progressista, humanista e aberto ao diálogo, alguns problemas enraizados na história do nosso país ainda persistem e se interligam, como a repressão de agentes de segurança do Estado para com as minorias e suas expressões culturais. O tecido cultural, inclusive, tido como inimigo do governo Bolsonaro, segue catando os cacos dos seus desmontes, se levantando das cinzas para poder alcançar novos voos e conquistar novos espaços, lutando contra os mais diversos preconceitos de ordem estrutural.
É nesse contexto que a banda Pernambucana, Janete Saiu Para Beber, do Cabo de Santo Agostinho, lança o primeiro videoclipe da carreira, para a música “Polícia para quem?”. A banda iniciou sua trajetória em 2010 e traz em sua sonoridade uma grande influência da cena Pernambucana dos anos 90, tendo inspiração no Movimento Mangue, Hip Hop, Punk e na cultura popular, como Coco de Roda, Frevo e Caboclinho. Suas letras revelam críticas sociais e pessoais, por serem o reflexo do estilo de vida e experiências pessoais de seus integrantes. A banda é formada atualmente por César Braga – vocal; Kin Noise – Guitarra; Pedro Attack – Baixo; Niel Melo – Bateria; Eudes Jr - Percussão; e Erivaldo Romão - Percussão.
“Polícia para quem” é uma música autoral da Janete Saiu Para Beber, em que a letra contesta toda a repressão e violência cometida pela polícia brasileira, com o propósito de fomentar o debate acerca dessa estrutura opressiva que é tida como padrão de atuação dos agentes de segurança do Estado. Sabemos que o país tem uma polícia violenta (principalmente contra negros e pobres), uma das que mais matam no mundo, mas também é uma das que mais sofrem com a morte de agentes, e esse fato escancara o quanto a segurança pública está defasada e precisa urgentemente de uma remodelação profunda de seu sistema institucionalizado de forma racista e preconceituosa.
Já o videoclipe de “Polícia para quem”, dirigido por Cleiton Costa e com produção musical do Jadson Bactéria, captura toda a energia de um show da JSPB, contando com a participação camarada da banda paulista CaosMaria, representada pela persona do ex vocalista Victor AL.N, que agora segue uma carreira solo como rapper, e também do ator Milton Raulino interpretando o policial. Kin Noise, guitarrista e ilustrador da Janete explica como foi o processo de produção do videoclipe: “A gente fez um ‘faça você mesmo’ com o melhor que a gente poderia fazer. Banquei muitos custos, mas teve muita força coletiva. Figurantes, ator, direção, a produção toda. O estúdio acreditou no projeto e fez um valor de custo. Todo mundo envolvido apostou na ideia. Sem amigos a gente não teria feito nada. Foi tipo cinema de guerrilha.”
Além da banda tocando com toda sua instiga já conhecida, o videoclipe reproduz gravações recentes de abusos e ações truculentas da polícia, umas que resultaram em morte e outras se equiparando ao sadismo típico das torturas que aconteciam na época da ditadura militar. César Braga, vocalista e compositor da Janete dá a sua visão sobre a arte como forma de se expressar perante injustiças sociais: “A arte é a forma mais autêntica de crítica que sempre existiu, tem liberdade de fazer rir e fazer chorar. Acreditamos que se não tocarmos em assuntos delicados que estão diretamente ligados ao bem-estar comum, estaremos permitindo que uma determinada ideologia se aproprie da nossa cultura. Sendo assim, acreditamos que é necessário ir de contra a instituição que bate em nossos irmãos periféricos que são trabalhadores e pagadores de impostos, pois convivem diariamente com o abuso de poder da polícia e suas práticas violentas, racistas e segregacionistas.”
Enquanto os agentes de segurança do Estado não desenvolverem consciência de classe para se enxergarem como trabalhadores que merecem dignidade, melhores condições de trabalho, acompanhamento psicológico sério e um treinamento para lidar com a população de forma humanizada, a democracia estará em estado de alerta. E a Janete entrega “Polícia para quem” como música em forma de protesto, denúncia e também um convite a rebelião das mentes, acertando em cheio nessa mistura potente de Rock e Rap, estilos musicais que historicamente carregam consigo a indignação contra o sistema opressor das liberdades e expressões culturais.

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